domingo, 3 de abril de 2011

Aquele Estranho... Parte III

A corrida tinha de ficar para o dia seguinte, bem como os estudos. Fiz os bifes o melhor que pude, cozi uma massa esparguete e fiz um sumo de laranja natural. Jantei, lavei a loiça, vesti umas calças de ganga e saí. Os nervos apoderaram-se de mim. Conduzi tentando focar-me na estrada. Umas gotas de chuva começaram a cair. Não acreditava que estava a ir para um encontro. Chegar até àquela pessoa era algo que estava muito acima daquilo que eu considerava expectável. Tentei afastar todos aqueles pensamentos, coloquei uma música feliz. Cantei e sorri e substituí tudo o que abundava na minha cabeça apenas por uma coisa. Eu mereço isto. Se ele me procurou é porque eu sou especial, porque sou mesmo. Logo, isto é possível. E eu estou feliz. Vai ser um sucesso.
Estacionei no subterrâneo, subi as várias escadas rolantes e quando chego a meio do último lance, avisto-o. Ele não me vê. Caminho devagar até à mesa que escolheu.
 - Olá! Estás à minha espera há muito tempo? – Questionei…
 Ele olhou-me com os olhos bem abertos. Eu confesso que fiquei um pouco assustada. O facto de ele nada dizer naqueles segundos que se seguiram estava a incomodar-me. Levantou-se, cumprimentou-me e puxou uma cadeira para eu me sentar.
 - Estou muito melhor agora. Não gosto muito de estar sozinho em locais com muita gente. Faz-me sentir pequeno. Ainda bem que já chegaste.
 - Mas eu não me atrasei – respondi. – Tu é que se calhar chegaste cedo…
 - Sim, cheguei um pouco mais cedo. Ainda pensei que pudesses não vir, e isso preocupava-me.
 - Porquê? Não tenho esse hábito. Se não viesse dizia-to simplesmente. Olha, não vou. Não me apetece ou não quero. Sei que não me conheces bem, mas sou sempre muito honesta. Há quem não goste deste meu lado honesto, que às vezes pode ser cruel e doloroso. Sabes que nem toda a gente está preparado para lidar com a verdade. Preferem ouvir as coisas de forma camuflada. Meio abafadas para não doer tanto. Mas eu não sei ser de outro modo, simplesmente não sei. É mesmo o meu feitio, ser transparente e honesta.
 - Mas isso é bom, no meu entender. Pode custar e doer, mas é a realidade. É a verdade e não uma mentira mascarada. Falando de outras coisas, vens comigo a Évora? Vai ser giro. Eu sei que gostas muito de fotografia, podes aproveitar para fazer um gosto ao dedo. Eu conheço uns lugares que te quero mostrar. E tu vais adorar.
 - Mais um ponto fraco. Tu realmente andaste mesmo à procura de tudo aquilo a que eu não conseguia resistir. Fizeste muito bem o trabalho de casa. Ainda estou para saber como conseguiste dar a volta ao meu irmão para ele te dizer todas essas coisas a meu respeito…
 - Não foi preciso nada de especial. Apenas tive de lhe garantir que vinha por bem, Isso foi suficiente. Sabes uma coisa? Ele estima-te muito. Preocupa-se. Achei de um carinho surpreendente. Olha, queres tomar café?
 - Não. Mas quero comer um crepe. Podias comer um comigo, porque é grande. Pode ser?
 - Dividir um crepe contigo? Não achas que isso é excesso de confiança? No primeiro dia que nos vemos partilhar um prato? – Riu-se daquela forma que me deixava sem palavras…
 - Tens toda a razão. É melhor eu comer o crepe sozinha, até porque tu não deves querer engordar e aquele crepe é uma bomba calórica, mas não resisto…
 - Achas mesmo? Eu não engordo porque sou terrível. Tu já deves ter ouvido os meus gritos, já te deves ter apercebido que o meu feitio não é dos fáceis. Nunca reparaste?
 - Reparei e de que maneira. Pareces um trovão. E depois quando fazes esse ar inofensivo, parece que estamos a falar de duas personalidades diferentes. Vou lá buscar o crepe, guarda aí a mesa…
Enquanto esperava na fila ele encostou-se na cadeira. Dei com ele a sorrir. E eu sorria também. Parecia que nos conhecíamos há muito mais tempo. Percebi nitidamente que aquele mau feitio era simplesmente uma forma de se fazer ouvir. De se impor perante as pessoas com quem trabalhava. Porque o pouco que conhecia dele, era de o ver por ali. Quase há 6 anos que nos cruzávamos e agora estávamos perto de ir partilhar um crepe. Eu sentia-me bem e era apenas nisso que me queria focar.
A noite foi muito agradável. Partilhámos o doce e ele gostou muito. Nunca tinha provado aquela delícia. Depois caminhámos um pouco pelo centro e ele levou-me ao carro. Pediu-me que ligasse quando chegasse a casa. Fez-me uma festa no rosto e eu fiquei sem jeito. Tinha o estômago cheio de borboletas. Estava a dois dias de ir com ele para Évora e nem sabia bem como me iria comportar. Tudo a seu tempo, pensei. Só pode correr bem.

1 comentário:

  1. Continuas a escrever bem e a deixar-me cheia de curiosidade de como vai acabar esta história.

    bjs

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